Não crendo em nada com firmeza


Não crendo em nada com firmeza, e acceitando portanto como egualmente boas, em principio, de onde não passam, todas as opiniões; crendo somente que a these vale o que vale o theorista, e a emoção o que vale o expressor d'ella, não pude habituar-me áquelle dogma literario que consiste em usar de uma personalidade. A personalidade é uma fórma de crença, e, como uma crença, é impossivel ao raciocinador.

Não vae distancia de crer na verdade externa ao crer na interna, de acceitar como certo um conceito do mundo ao acceitar como certo um conceito de nós mesmos. Não affirmo que tudo seja fluctuante, porque isso seria affirmar; porém tudo é de facto fluctuante para o nosso entendimento, e a verdade, desdobrando-se-nos em verdades varias, desapparece porque a não pode haver multipla.


Título: Não crendo em nada com firmeza
Heterónimo: Não atribuído
Número: 533
Página: 491
Nota: [15(4)-61r e 61ar];
Nota: Jerónimo Pizarro edita este texto em apêndice, integrado no conjunto "Textos sem destinação certa inventariados fora do núcleo" (2010: 490-516). O verso da folha (15(4)-61v - dact.), que está datilografado a tinta preta e contém uma série de referências comerciais dispostas em três colunas, é transcrito por Jerónimo Pizarro como Anexo ao texto 533 (2010: 1008).