L. do D.
O lemma que hoje mais requeiro
para definição do meu espirito
é o de creador de indifferenças.
Mais do que outra, quereria que a
minha acção pela vida fosse
de educar os outros a sentir cada
vez mais para si-proprios,
e
cada vez menos segundo a lei
dynamica da collectividade.
Educar naquella antisepsia espiri-
tual pela qual não pode haver
contagio de vulgaridade, parece-
me o mais constellado destino
do pedagogo intimo que eu quereria
ser. Que quantos me lessem apren-
dessem — pouco a pouco embora, como
o assumpto manda — a não ∧ter
sensação nenhuma perante os
olhares alheios e as opiniões
dos outros, esse destino engrinal-
daria sufficientemente ∧de sobra a esta-
gnação escolastica da minha vida.
A impossibilidade de agir foi sempre em
mim uma molestia com etiologia meta-
physica.
Fazer um gesto foi sempre, para
o meu sentimento das cousas,
uma perturbação,
um desdobramento, no universo exterior;
mexer-me deu-me sempre a impressão que
não deixaria intactas as estrellas nem os
∧ceus sem mudança. Porisso a importancia
metaphysica do mais pequeno gesto
cedo tomou ∧um relevo attonito dentro
de mim. Adquiri perante agir um
escrupulo de honestidade transcendental,
que me inhibe,
desde que o fixei na
minha consciencia,
de ter relações muito
accentuadas com o mundo palpavel.