Conheço, translata, a sensação


Conheço, translata, a sensação de ter
comido de mais. Conheço-a com a
sensação, não com o estomago. Ha dias
em que em mim se comeu de mais. Estou
pesado de corpo e lorpa de gestos;
tenho vontade de não me tirar de
alli de maneira nenhuma.

Mas nessas occasiões, como facto
impropicio, soe surgir, do meu mo-
dorrar indemne, um resquicio de
imaginação perdida. E fórmo planos
no fundo do desconhecimento, estructuro
coisas nas raizes da hypothese, e o
que não ha de acontecer tem
para mim um grande brilho.



Nessas horas extranhas, não é
só a minha vida material, mas a minha propria
vida moral, que me são só appensos —
desleixo a idéa do dever mas tambem a
idea de ser, e tenho somno physico
do universo inteiro. Durmo o
que conheço e o que sonho com uma
egualdade que me pesa nos olhos.
Sim, nessas horas sei mais de mim
do que nunca soube,

e todo eu sou todas as sestas de mendigos entre as
arvores da quinta de Ninguem.


Identificação: bn-acpc-e-e3-28-1-101_0049_24_t24-C-R0150 | bn-acpc-e-e3-28-1-101_0050_24v_t24-C-R0150
Heterónimo: Não atribuído
Formato: Folha (22.6cm X 16.3cm)
Material: Papel
Colunas: 1
LdoD Mark: Sem marca LdoD
Manuscrito (pen) : Testemunho manuscrito a tinta preta.
Nota: , Texto escrito no recto de uma folha inteira. No verso da folha consta uma anotação comercial.
Fac-símiles: BNP/E3, 28-24.1 , BNP/E3, 28-24.2