A minha imagem


A minha imagem, tal qual eu a via nos espelhos, anda sempre ao collo da minha ternura. Eu não podia ser senão louco e debil como sou, mesmo nos meus pensamentos. Tudo em mim é /de/ um principe de chromo collado no album velho de uma creança que morreu sempre ha muito tempo.

(Amar-me é ter pena de mim.)

Um dia, lá para o fim do futuro, alguem escreverá sobre mim um poema, e talvez só então eu comece a reinar no meu Reyno.

— Senhor, não vos afflijaes!

— Não me afflijo... A minha dôr é *tão *bella que eu nem sei como a soffrer...

É a corôa que a nuvem tem.

É o throno regio que nunca será nuvem.

Deus é o existirmos e isto não ser tudo.


Título: A minha imagem
Heterónimo: Não atribuído
Número: 558
Página: 504
Nota: [94-75r];
Nota: Jerónimo Pizarro edita este texto em apêndice, no conjunto "Textos sem destinação certa inventariados fora do núcleo" (2010: 490-516).