Todos aqueles acasos infelizes da nossa vida



Todos aqueles acasos infelizes da nossa vida, em que fomos, ou ridículos, ou reles, ou atrasados, consideremo-los, à luz da nossa serenidade íntima, como incómodos de viagem. Neste mundo, viajantes, voluntários ou involuntários, entre nada e nada ou entre tudo e tudo, somos somente passageiros, que não devem dar demasiado vulto aos percalços do percurso, às contundências da trajectória. Consolo-me com isto, não sei se porque me consolo, se porque há nisto que me console. Mas a consolação fictícia torna-se-me verdade se não penso nela.

Depois, há tantas consolações! Há o céu azul alto, limpo e sereno, onde bóia qualquer nuvem imperfeita. Há a brisa leve, que agita os ramos densos das árvores, se é no campo; que faz oscilar as roupas estendidas, nos quartos andares, ou quintos, se é na cidade. Há o calor ou o fresco, se os há, e sempre, no fundo, uma memória, ou uma saudade, ou uma esperança, e um sorriso de ninguém à janela do nada, o que desejamos batendo à porta do que somos, como pedintes que são o Cristo.