Como nas horas em que a trovoada se prepara
Como nas horas em que a trovoada se prepara e os ruídos da rua falam alto com uma voz separada.
A rua franziu-se de luz intensa e pálida e o negrume torvo tremeu, de leste a oeste do mundo, com um estrondo feito de escangalhamentos ecoantes... A tristeza dura da chuva bruta piorou o ar negro de intensidade feia. Frio, morno, quente — tudo ao mesmo tempo — o ar em toda a parte era errado. E, a seguir, pela ampla sala uma cunha de luz metálica abriu brecha nos repousos dos corpos humanos, e, com o sobressalto gelado, um pedregrulho de som bateu em toda a parte, esfacelando-se num só grande silêncio.
O som da chuva diminuiu como uma voz de menos peso. Depois aumenta [...] O ruído das ruas diminuiu angustiantemente.
Nova luz, de um amarelado rápido, tolda o negrume surdo, mas houve agora uma respiração possível antes que o punho do som trémulo ecoasse súbito doutro ponto; como uma despedida zangada, a trovoada começava a aqui não estar.
Uma súbita luz formidável estilhaça-se. Estaca dentro dos cérebros e das portas. Tudo estacou. Os corações pararam um momento. Todos são pessoas muito sensíveis. O silêncio aterra como se houvera morte.
O som da chuva que aumenta, alivia como lágrimas de tudo. Há chumbo.
... com um sussurro arrastado e findo, sem luz na luz que aumentava, o tremor da trovoada acalmava nos largos longes — rodava em Almada...