SONHO TRIANGULAR [No meu sonho]


SONHO TRIANGULAR

No meu sonho no convés estremeci — é que pela minha alma de Príncipe Longínquo passou um arrepio de presságio...

Um silêncio ruidoso a ameaças invadiu como uma brisa lívida a atmosfera visível da saleta.

Tudo isto é haver um brilho excessivo e inquietante no luar sobre o oceano que não ondula já mas estremece; tornou-se evidente — e eu ainda os não ouvi — que há ciprestes ao pé do palácio do Príncipe.

O gládio do primeiro relâmpago volteou vagamente no além... É cor de relâmpago o luar sobre o mar alto e tudo isto é ser ruínas já e passado afastado o meu palácio de príncipe que nunca fui...

Com um ruído soturno e aproximando-se o navio corta as águas, a saleta escurece lividamente, e não morreu, não está preso algures, não sei o que [é] feito dele — do príncipe — que gélida coisa desconhecida lhe é o destino agora?...


Título: SONHO TRIANGULAR [No meu sonho]
Heterónimo: Bernardo Soares
Número: 300
Página: 290
Nota: [94-87, ms.];