Duas vezes, naquella



L; do D.

Duas vezes, naquella minha adolescencia que sinto longinqua, e que, por assim sentil-a, me parece uma cousa lida, um relato intimo que me fizessem, gosei a dor da humilhação de amar. Do alto de hoje, olhando para traz, para esse passado, que já não sei designar nem como longinquo nem como recente, creio que foi bom que essa experiencia da desillusão me acontecesse tão cedo.

Não foi nada, salvo o que passei commigo. No aspecto externo do assumpto intimo, legiões humanas de homens teem passado pelas mesmas torturas. Mas ☐

Cedo de mais obtive, por uma experiencia, simultanea e conjuncta, da sensibilidade e da intelligencia, a noção de que a vida da imaginação, por morbida que pareça, é comtudo aquella que calha aos temperamentos como é o meu. As ficções da minha imaginação (posterior) podem cansar, mas não doem nem humilham. Ás amantes impossiveis é tambem impossivel o sorriso falso, o dolo do carinho, a astucia das caricias. Nunca nos abandonam, nem de qualquer modo nos cessam.

São sempre cataclysmos do cosmos as grandes angustias da nossa alma. Quando nos chegam, em torno a nós se erra o sol e se perturbam as estrellas. Em toda a alma que sente chega o dia em que o Destino nella representa um apocalypse de angustia — um entornar dos ceus e dos mundos todos sobre a sua desconsolação.

Sentir-se superior e ver-se tratado pelo Destino como inferior aos infimos — quem pode vangloriar-se de estar homem em tal situação.

Se eu um dia pudesse adquirir um rasgo tão grande de expressão, que concentrasse toda a arte em mim, escreveria uma apotheose do somno. Não sei de prazer maior, em toda a minha vida, que poder dormir. O apagamento integral da vida e da alma, o afastamento completo de tudo quanto é seres e gente, a noite sem memoria nem illusão, o não ter passado nem futuro, a ☐