Jacinto do Prado Coelho - edição anotada - Usa Jacinto do Prado Coelho(320)

Saber que será má a obra


Saber que será má a obra que se não fará nunca. Peor, porém, será a que nunca se fizer. Aquella que se faz, ao menos, fica feita. Será pobre mas existe, como a planta mesquinha no vaso unico da minha visinha aleijada. Essa planta é a alegria d'ella, e tambem por vezes a minha. O que escrevo, e que reconheço mau, pode tambem dar uns momentos de distracção de peor a um ou outro espirito maguado ou triste. Tanto me basta, ou me não basta, mas serve de alguma maneira, e assim é toda a vida.

Um tedio que inclue a anticipação só de mais tedio; a pena, já, de amanhã ter pena de ter tido pena hoje — grandes emmaranhamentos sem utilidade nem verdade, grandes emmaranhamentos...

...onde, encolhido num banco de espera da estação apeadeiro, o meu desprezo dorme entre o gabão do meu desalento...

... o mundo de imagens sonhadas de que se compõe, por egual, o meu conhecimento e a minha vida...

Em nada me pesa ou em mim dura o escrupulo da hora presente. Tenho fome da extensão do tempo, e quero ser eu sem condições.