Para sentir a delicia e o terror


L. do D.

Para sentir a delicia e o terror
da velocidade não preciso de automoveis
velozes nem de comboios expressos.
Basta-me um carro electrico, e
a espantosa faculdade de abstracção que
tenho e cultivo.

N'um carro electrico em marcha eu
sei, por uma attitude mathematica e
instantanea de analyse, separar a
idea de carro da idea de velocidade,
separal-as de todo, até serem
cousas-reaes diversas. Depois, posso
sentir-me seguindo não dentro do
carro mas dentro da
Mera-Velocidade d'elle. E, avançando,
se acaso quero o delirio da
velocidade enorme, posso transportar
a idea para o Puro Conceito da
Velocidade e a meu bom prazer
augmental-a ou diminuil-a, alargal-a
para além de todas as velocidades
possiveis de vehiculos mechanicos.


2

Correr riscos reaes, além de me
apavorar — não é por medo que
eu sinto excessivamente — perturba-me
a perfeita attenção ás minhas
sensações, o que me incommoda
e me despersonaliza.

Nunca vou para onde ha risco.
Tenho medo e tedio dos perigos.



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Um poente é um pheno-
meno intellectual.


Identificação: bn-acpc-e-e3-7-1-50_0023_12_t24-C-R0150 | bn-acpc-e-e3-7-1-50_0024_12v_t24-C-R0150
Heterónimo: Não atribuído
Formato: Folha (16.2cm X 11.0cm)
Material: Papel
Colunas: 1
LdoD Mark: Com marca LdoD
Manuscrito (pen) : Texto manuscrito a tinta preta.
Data: 1915 (low)
Nota: LdoD, Texto escrito em recto e verso de um quarto de folha de papel almaço, semelhante a folhas de papel com a marca de água "ALMAÇO PRADO" (cf. 5-53-54). Pizarro afirma que tardiamente T. S. Cunha acrescentou uma linha final, a jeito de conclusão, a este trecho, que terá encontrado num "fragmento avulso", cuja cota omite. Ver "Livro do Desassossego" (2008: 228 e 621).
Fac-símiles: BNP/E3, 7-12.1 , BNP/E3, 7-12.2