PERISTILO | FIM (último trecho)


FIM
(último trecho)

Criemos, ó Apenas-Minha, tu por existires e eu por te ver existir, uma arte outra do que toda a arte havida.

Do teu corpo de ânfora inútil saiba eu tirar a auréola esquecida de /novos versos/, e ao teu ritmo lento de onda sem origem, saibam os meus dedos trémulos ir buscar as linhas pérfidas de uma prosa virgem de a terem ouvido.

O teu sorriso vago, indo-se, seja para mim símbolo — emblema visível do tédio do inúmero mundo ao saber-se erro e incerteza.

As tuas mãos de tocadora de harpa me fechem as pálpebras quando eu morrer de te ter dado a construir a minha vida.

E tu, que não és ninguém, serás para sempre, ó Suprema, a arte querida dos deuses que nunca foram, e a mãe virgem e estéril dos deuses que nunca serão.


Título: PERISTILO | FIM (último trecho)
Heterónimo: Vicente Guedes
Número: 9
Página: 53 - 54
Nota: [9-40, ms.];
Nota: Teresa Sobral Cunha integra este texto no conjunto 'PERISTILO' (Pessoa: 2008: 51-53).