Carta | Eu não saberia nunca
Carta
Eu não saberia nunca como ageitar
a minha alma a levar o meu corpo a
possuir o seu. Dentro de mim, mesmo
ao pensar n'isso tropeço em obstaculos
que não vejo, enredo-me em teias
que não sei o que são. Que muito
mais me não aconteceria se eu
quizesse possuil-a realmente?
Que eu — repito-lh'o — era incapaz de
o tentar fazer. ∧Nem sequer me ageito a
sonhar-me fazendo-o.
São estas, minha Senhora, as palavras
que tenho a escrever á margem da significação
do seu olhar involuntariamente interrogativo.
É n'este livro que, primeiro, lerá esta
carta para si. Se não soubér que é
para si, resignar-me-hei a que assim seja.
Escrevo mais para me entreter do que
para lhe dizer qualquér cousa. Só as cartas com-
merciaes são dirigidas. Todas as outras
devem, pelo menos para o homem superior, ser
apenas d'elle para si-proprio.
Nada mais tenho a dizer-lhe. Creia que a admiro tanto quanto
posso. Ser-me-hia agradavel que pensasse em mim ás vezes.