Senhor Rei do Desapego e da Renuncia, Imperador da Morte e do Naufragio, sonho vivo errando, faustuoso, entre as ruinas e os exilios do mundo!
Senhor Rei da Desesperança entre pompas, dono doloroso dos palacios que o não satisfazem, mestre dos cortejos e dos apparatos que não conseguem apagar a vida!
Senhor Rei erguido dos tumulos, que vieste na noite e ao luar, contar a tua vida ás vidas, pagem do[s] lyrios desfolhados, arauto imperial da frieza dos marfins!
Senhor Rei Pastor das Vigilias, cavalleiro andante das Angustias, sem gloria e sem dama ao luar das estradas, senhor das florestas nas escarpas, perfil mudo, de viseira cahida, passando nos valles, incomprehendido pelas aldeias, chasqueado pelas villas, desprezado pelas cidades!
Senhor Rei que a Morte sagrou Seu, pallido e absurdo, esquecido e desconhecido, reinando entre pedras foscas e velludos velhos, no meu throno ao fim do Possivel, com a sua côrte irreal cercando-o, sombras, e a sua milicia phantastica,
guardando-o, mysteriosa e vazia.
Trazei, pagens; trazei, virgens; trazei servos e servas, as taças, as salvas e as grinaldas para o festim a que a Morte convida! Trazei-as e vinde de negro, com cabeça coroada de /myrtos/.
Mandrágora seja o que tragaes nas taças, ☐ nas salvas, e as grinaldas sejam de violetas ☐, das flores tristes que lembrem a tristeza.
Vae o Rei a /jantar/ com a Morte, no seu palacio antigo, á beira do lago, entre as montanhas, longe da vida, alheio ao mundo.
Sejam de instrumentos extranhos, cujo mero som faça chorar, as orchestras que se preparam para a festa. Os servos vistam librés sombrias, de cores desconhecidas, faustosas e simples como os catafalcos dos suicidas.
E, antes que o festim comece, passe pelas alamedas dos largos parques o grande cortejo medieval de purpuras mortas, o grande cerimonial /em marcha/, como a belleza num pesadelo.
A Morte é o triumpho da Vida!
Pela morte vivemos, porque só somos hoje porque morremos para hontem. Pela morte esperamos, porque só podemos crer em amanhã pela confiança na morte de hoje. Pela Morte vivemos quando sonhamos, porque sonhar é negar a vida. Pela morte morremos quando vivemos, porque viver é negar a eternidade! A Morte nos guia, a morte nos busca, a morte nos acompanha. Tudo o que temos é Morte, tudo o que queremos é Morte, é morte tudo o que desejamos querer.
Uma briza de attenção percorre as alas.
Eil-o que vai chegar, como a morte que ninguem vê e a ☐ que não chega nunca.
Arautos! Tocae! Attendei!
Teu amor pelas cousas sonhadas era o teu desprezo pelas cousas vividas.
Rei-Virgem que desprezaste o amor,
Rei-Sombra que desdenhaste a luz,
Rei-Sonho que não quizeste a vida!
Entre o estrepito surdo de cymbalos e atabales, a Sombra te acclama imperador!