Attingir, no stado mystico
L. do D.
Attingir, no stado mystico, só o que
esse stado tem de grato, sem o que tem
de exigente; ser o extatico de deus nenhum,
o mystico ou epopta sem ∧iniciação;
passar o curso dos dias na meditação de
um paraiso em que ∧se não crê — isto tudo
sabe bem á alma, se ella conhecer o
que é desconhecer.
Vão altas, por cima de onde estou, corpo
dentro de uma sombra, as nuvens silenciosas;
vão altas, por cima de onde estou, alma
captiva num corpo, as verdades incog-
nitas... Vae alto tudo... E tudo
passa no alto como em baixo, sem
nuvem que deixe mais ∧do que chuva, em
verdade que deixe mais ∧do que dor...
Sim, tudo o que é alto passa alto,
e passa; tudo o que é de
appetecer está longe e passa longe...
Sim, tudo attrahe, tudo é alheio e
tudo passa.
Que me importa saber, ao sol ou á
chuva, corpo ou alma, que passarei
tambem? Nada, salvo a esperança de
[que] tudo seja nada, e portanto ∧o nada
seja tudo.
29-6-1934.