O dinheiro é bello


L. do D.

O dinheiro é bello, porque é uma libertação.

Querer ir morrer a Pekin e não poder é das cousas que pesam sobre mim como a idéa d'um cataclysmo vindouro.

Os compradores de cousas inuteis sempre são mais sabios do que se julgam — compram pequenos sonhos. São creanças no adquirir. Todos os pequenos objectos inuteis cujo acenar ao saberem que têm dinheiro os faz compral-os, possuem-os na attitude feliz de uma creança que apanha conchinhas na praia — imagem que mais do que nenhuma dá toda a felicidade possivel. Apanha conchas na praia! Nunca ha duas eguais para a creança. Adormece com as duas mais bonitas na mão, e quando lh'as perdem ou tiram — o crime! roubar-lhe bocados exteriores da alma! arrancar-lhe pedaços de sonho! — choram como um Deus a quem roubassem um universo recem-creado.


Título: O dinheiro é bello
Heterónimo: Bernardo Soares
Volume: II
Número: 458
Página: 198
Nota: [9-35 e 35a, ms.];