Mallet - Usa Jerónimo Pizarro(293)

Ouviu-me ler os meus versos


Ouviu-me ler os meus versos — que nessa occasião li bem, porque me distrahi — e disse-me, com a simplicidade de uma lei natural: "Você, assim, e com outra cara, seria um grande fascinador"... A palavra "cara", mais que a referencia que continha, ergueu-me de mim pela gola do desconhecermo-nos. Vi o espelho do meu quarto, o meu pobre rosto de mendigo sem pobreza; e de repente o espelho separou-se e o espectro da Rua dos Douradores abriu-se deante de mim como um nirvana de carteiros.

A acuidade das minhas sensações chega a ser uma doença que me é alheia. Soffre-a outro de quem eu sou a parte doente, porque verdadeiramente sinto como em dependencia de uma maior capacidade de sentir. Sou como um tecido especial, ou até uma cellula, sobre a qual pesasse toda a responsabilidade de um organismo.

Se penso, é porque divago; se sonho, é porque estou disperto. Tudo em mim se embrulha commigo, e não tem fórma de saber de ser.