Edição RZ - Usa Richard Zenith(238)

Nenhum prémio certo tem a virtude


Nenhum prémio certo tem a virtude, nenhum castigo certo o pecado. Nem seria justo que houvesse tal prémio ou tal castigo. Virtude ou pecado são manifestações inevitáveis de organismos condenados a um ou a outro, servindo a pena de serem bons ou a pena de serem maus. Por isso todas as religiões colocam as recompensas e os castigos, merecidos por quem, nada sendo nem podendo, nada pôde merecer, em outros mundos, de que nenhuma ciência pode dar notícia, de que nenhuma fé pode transmitir a visão.

Abdiquemos, pois, de toda a crença sincera, como de toda a preocupação de influir em outrem.

A vida, disse Tarde, é a busca do impossível através do inútil. Busquemos sempre o impossível, porque tal é o nosso fado; busquemo-lo através do inútil, porque não passa caminho por outro ponto; ascendamos, porém, à consciência de que nada buscamos que possa obter-se, de que por nada passamos que mereça um carinho ou uma saudade.

Cansamo-nos de tudo, excepto de compreender, disse o escoliasta. Compreendamos, compreendamos sempre, e façamos por tecer astuciosamente, capelas ou grinaldas que hão-de murchar também, as flores espectrais dessa compreensão.